12 de setembro de 2011

André, nunca me esqueci de você


             A história que agora escrevo aconteceu quando eu tinha apenas dez anos e morava nessa mesma casa. Tinha um menino em minha rua chamado André, era tão baixo quanto sua voz. Seus cabelos foram os mais belos que já vi, porém do olhar posso falar muito pouco: sempre mirados no chão, nunca em ninguém, nunca em mim, o que me atingiu bem no peito. Se todo mundo fosse verde, ele seria azul. Ele era como um cacto em meio a um bosque florido, pois ele era meio triste e distante de todo mundo. Era raro vê-lo na rua e nunca saia pra brincar, o que me desanimava, afinal, eu tinha apenas dez anos e já estava apaixonada. Tudo o que eu queria era vê-lo o tempo todo e às vezes subia na árvore em frente de sua casa para tentar encontra-lo, mas nada, nunca tinha bons resultados.

            Uma vez ouvi minha irmã conversar em seu quarto sobre maquiagem. Ela dizia que deixava as meninas mais bonitas e os garotos gostavam. Eu entrei escondida depois e passei batom, uma sombra azul em todo o meu olho. Lembro que minhas bochechas ficaram vermelhas de tanta maquiagem. Naquele dia, todos os meus amigos riram de mim e ele, que passava na calçada, olhou o motivo das risadas e não se importou. Naquele dia, chorei.
            Dois dias depois, eu soube que ele iria morar com sua avó, bem distante de mim. Antes de pensar em chorar, respirei fundo e criei coragem para dizer-lhe tudo o que guardei aqui dentro sobre ele. Fui dormir fazendo planos em como dizer. No dia seguinte, voltei da escola correndo ansiosa e o encontrei de mala feita e estava quase pronto pra partir. Gritei seu nome.
            - Espere! – apoiei minhas mãos no joelho, respirando fundo várias vezes. – Eu queria te dizer uma coisa. É que eu... Gosto de você.
            Seus olhos, que eram sempre cansados e tristes, se abriram rapidamente, me olhando assustados.
            - Quero dizer – forcei uma risada –, eu gosto muito do seu cabelo, ele é legal. Mais que isso, eu gosto de imaginar como é sua voz, porque nunca te ouvi falar e gosto ainda de imaginar o porquê de você ser tão calado. Gosto de pensar o que você faz tanto em casa já que não sai nunca para brincar aqui com a gente. Já ouvi falarem que você é metido, mas eu não concordo. Eu te acho... Hm, diferente. Especial. Queria tanto ter te conhecido. E agora que você tá indo, vá sabendo que há alguém aqui que te acha incrível.
            Ele demorou cerca de cinco segundos para responder – o que, acredite, foi agoniante.
            - Por que não me disse antes? Seria tão bom saber disso... Sabe, eu nem sempre fui tão chato assim. Eu falava, eu sorria, tinha amigos, era normal. O que te vou falar nunca falei para ninguém e, por favor, não fale também. Mas meus pais não gostam de mim. Já vi meu pai bater na minha mãe, uma vez. Tentou me bater também, mas ela me protegeu. Ela diz que é por causa da bebida, bem, eu nunca vou beber. Agora vão se separar e nenhum quer ficar comigo. Eu devo ser terrível. – ele abaixou a cabeça – Mas você gosta de mim.
            Antes de se virar e correr para o carro, eu o vi sorrir pela primeira vez e logo em seguida me deu um beijo na bochecha e disse que gostava de mim também.
            Hoje me arrependo, ah como me arrependo de não ter lhe dito tudo antes. Minha vida seria tão diferente, a minha, a dele. Entretanto, já se passaram vinte anos. E nunca me esqueci de André.

2 comentários:

  1. Uau, que lindo! Fiquei emocionada, sem palavras. As vezes as palavras que nós não dizemos machucam as pessoas. Mas que bom que você conseguiu falar, mesmo sendo um pouco tarde, fez ele mais feliz.
    http://dinhacavalcante.blogspot.com/

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  2. Que lindo, me emocionou o seu texto. Encantador e seu jeito de escrever realmente conquista ;)
    Parabéns com seu blog, continue assim. Um beijo ;*

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Quanta gente!